Baile da Lolo

Anexo do Manifesto do Samba Abstrato 2017

Este é o texto principal do compêndio Manifesto do Samba Abstrato




Nascida no Carnaval de 2016, Lolo Figueiroa foi celebrada como um dos novos personagens do carnaval de São Paulo: Lolo, a Paneleira, popularmente conhecida como Branca Maluca, trouxe de forma cômica o debate político e social para o carnaval de rua.

Neste ano, Lolo Figueiroa orgulhosamente apresenta o *Baile da Lolo*, uma festa à fantasia onde festejaremos a decadência moral e a estética mofada da elite brasileira: entre paneleiros, patricinhas alienadas e playboys, o evento é uma crítica à semântica destes atores da sociedade e da política nacional.


Uma chamada à estética do espetáculo


Baile da Lolo é uma performance-carnavalesca-política satírica e ser encenada no Aparelha Luzia, em um sábado de carnaval. É uma festa à fantasia que combina farsas e jogos semânticos sobre temas de caráter político e social de maneira cômica e preta.

       
Foto: Caroline Nocetti

Note que tal qual o teatro medieval, o Baile da Lolo é considerado um

manifesto profano e satírico e não foi apoiado por acadêmicos ou críticos.

As farsas e encenações produzidas no dia 25 de fevereiro trazem o vaudeville de viés político ao público num ambiente afrofuturista em um quilombo em pleno centro da cidade de São Paulo.


              Erica Malunguinho: a mulher que pariu um quilombo urbano


Se por alguns deslizes o carnaval em algum momento se afastou de sua veia política (como isso se fosse possível) em 2017 a expressão carnavalesca se molda na crítica à atualidade política e social. E neste carnaval, os homenageados são ELES, os que diariamente em acabam com a nossa vida batendo suas panelas, atrasando nossos rolês e empatando a nossa foda. (1)




Além dos cordões e blocos carnavalescos temáticos e toda a linguagem do desfile e dos bailes, uma das referências para o formato performático do Baile da Lolo é a festas Club 69 da Cia. Inestable del 69 que são performances no Club Niceto em Buenos Aires, onde a trupe de teatro apresenta a cada semana um tema diferente com performance de dança e de interação.

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Principais elementos das linguagem teatral-política


Tempo

O ano é 2017. Mais um ano onde 50 mil jovens pretos serão assinados no Brasil-pós colonial e uma mulher será abusada a cada cinco minutos. É carnaval e faz calor. Século XXI ou XVIII.


            Aparelha Luzia tem baile de carnaval temático, por João Miguel Arcanjo

Espaço

Aparelha Luzia, quilombo urbano berço das novas tradições pretas universais.

Caráter


Popular preto de esquerda
Temas profanos, patéticos e políticos.
Personagens alegóricos e realistas.
União da música, do teatro, dos pretos, da política, do carnaval e do cansaço de viver a vida DELES.

Personagens


Protagonistas

Os de sempre. Os donos. A elite. Eles.

- Lolo Figueiroa: A Madrinha do Baile, representante da voz do povo paneleiro.

- Francisquinho Filho Júnior III, apresentador do Baile, host bem relacionado com todos os convidados (Biel Lima)

- Gustavinho Albuquerque, primo de Lolo e concorrente do 1° Concurso do Samba Abstrato (Alessandro Imperador)


Gustavinho Albuquerque, Lolo Figueiroa e Francisquinho Filho Jr. III

Corpo do Baile

A elite brasileira é representada por personagens como a carioca e viúva de militar Clothylde Felix, Karoll e Karlinhos Bittencourt, presidente do Clube do Balanço Financeiro, a médica Heleninha e seu esposo, Chris e Bia tentando subornar a dona da festa para entrar no camarote, entre outros.


Coletivo do Samba Abstrato


Mise en scene


Um tapete vermelho é estendido da entrada até o palco representado por um tapete persa, para demarcar o palco de semi-arena. O corpo do Baile se serve de taças e jogam notas de dinheiro no público debochando da vida perdulária e fútil da elite e seus #whitepeopleproblems




Figurino

Ref.: Brancos. (2)







Música

Festa Amem Brothers

                  Nove músicas para entender o Baile da Lolo


Roteiro

A performance-balada-política-carnavalesca é dividida em três atos. Sendo:


1º Ato: O início do Baile

Apresentação dos personagens e das fantasias. Chamada ao público para o espetáculo.

E no momento mágico, o teatro aconteceu. foto: Mariana Ser


2º Ato: O Concurso do Samba Abstrato

Uma farsa teatral estrelando Lolo, Biel e Gustavinho que armam para que Gustavinho se valha de seus privilégios e ganhe o primeiro Concurso do Samba Abstrato, cujo prêmio é o Pincel de Ouro, em homenagem ao prefeito-ceo da cidade de São Paulo.

O princípio da frontalidade é observado, os atores nunca dão as costas para o público e a plateia é convocada a participar de uma grande festa.

Concurso do Samba Abstrato. foto: Mariana Ser


3º Ato: Apogeu dos Paneleiros


foto: Mariana Ser


É a apoteose, o momento auge onde os sons levam tanto público quanto elenco ao delírio catártico do momento mágico. Por muita sorte e pela benção dos deuses ancestrais, o Bloco Afro Afirmativo ILU INÃ se apresentou no fim do terceiro ato e a conexão com o universo foi selada ao som do batuque preto.

Bloco Ilu Inã no apogeu do Baile. foto: Mariana Ser


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"Vi certo Carnaval em que alguns grupos de negros mascarados e fantasiados de velhos europeus imitavam-lhes os gestos...eram escoltados por alguns músicos, também de cor e igualmente fantasiados."  Jean Baptiste Debret, Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, T. I, pag. 220, 1836).”


O pintor francês Jean Baptiste Debret, conhecido por retratar as relações entre brancos e pretos no Brasil escravista, registra em 1823 em sua gravura “Cena de Carnaval” uma cena de pessoas pretas recriando as atrocidades de seus senhores e forma cômica no carnaval, pintando seus rostos de brancos e emulando o mal dos brancos e da elite da época. Na época, imperava o entrudo que eram brincadeiras de carnaval tradicionais de cada localidade. De forma debochada, esses homens agarravam as mulheres pretas, atiravam-se limão-de-cheiro uns nos outros, roubavam suas coisas, se mostravam irritáveis e destilavam suas chibatas teatrais, tudo em meio à folia e

era a coisa mais subversiva que poderiam fazer.

Desde então torna-se relevante no período onde a negritude e suas tradições culturais são mais celebradas, usurpadas e apropriadas, onde é aceitável denegrir-se de formas grotesca para viver a piada do que é ser preto, que é o Carnaval, que seguindo a tradição de nossos antepassados, nos juntemos para criar nossas tradições pós-modernas e passarmos uma mensagem política e artística para a sociedade.

Considerando a dimensão simbólica e cultural, o Baile da Lolo traz à critica popular os novos chicotes e senzalas sociais, mantidas às nossas custas como trabalhadores e cidadãos. O capital social atribuído a ELES e o poder social dos DONOS da terra, do mundo e das pessoas, seja essa gente escrava ou livre, através da precarização da mão de obra dos trabalhadores, do economicismo, do golpe, com o supremo e com tudo, eles riem da nossa existência e gozam das nossas lágrimas todos os dias e sobre isso é o nosso carnaval. Esta ousadia nasce do mesmo sentimento de nossos antepassados naquele carnaval de 1823: falar sobre o que fazem os brancos e como isso nos impede de existir plenamente. O mito da superioridade natural, a meritocracia, a supremacia branca, o poder do capital e as ideias introjetadas nas massas populares oprimidas usadas como depósito de conteúdo alienante, nos dizeres de Paulo Freire na sua Pedagogia do Oprimido, nascem de uma forte, crescente, contínua e avassaladora força de organização, mobilização e crescimento da representatividade dos pretos e dos negros do mundo (pretos, mulheres, pobres) (3) e é isso o que sempre fizemos.

Não tem mais volta. Não passarão.




:: Efigenias ::


Quem tem medo do carnaval?




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(1) O Manifesto do Samba Abstrato - 2017 é um compendio de três textos e outras mídias produzidos durante o carnaval 2016/17
- Manifesto do Samba Abstrato - 2017 | Sobre apropriação cultural e outros sambas
- Baile da Lolo
- Nove músicas para entender o Baile da Lolo

(2) Sim, brancos, ou precisou que os pretos colocassem uma peruca loira para vocês perceberem que a elite do Brasil, do acordão nacional, com o supremo e com tudo é branca?


(3) Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2005, 60.ª edição